'Adultização': Judiciário e governo Lula usam denúncia de Felca como pretexto para censura
Por trás do discurso de proteção infantil está a cilada que imporá o controle da liberdade de expressão
No dia 6 de agosto de 2025, o youtuber Felca, cujo nome real é Felipe Bressanim Pereira, publicou um vídeo em seu canal no YouTube denunciando a “adultização” infantil nas redes sociais — a prática de expor crianças a comportamentos adultos para fins de engajamento e lucro. O vídeo viralizou, acumulando mais de 36 milhões de visualizações em poucos dias. O impacto foi tão intenso que, em menos de uma semana, o tema saltou das bolhas digitais para a grande imprensa , culminando em uma entrevista exclusiva de Felca ao programa Fantástico, da TV Globo, exibida no domingo seguinte, 17 de agosto. Na reportagem, Felca reforçou a gravidade do problema, destacando casos como o do influenciador Hytalo Santos, preso dias após a denúncia por suspeita de exploração sexual infantil.
O episódio parecia, à primeira vista, um raro consenso: pais, educadores e até celebridades se uniram em torno da preocupação com a exposição sexual precoce de crianças. No entanto, rapidamente a causa foi sequestrada pelo governo Lula e seus militantes, e integrantes do Judiciário que buscam, a qualquer custo, implementar medidas de censura disfarçadas de proteção.
O momento não poderia ser mais oportuno para a esquerda: em meio às denúncias da Vaza Toga 2, que expuseram um gabinete paralelo do Ministro Alexandre de Moraes no TSE para investigar os presos do 8 de janeiro, e às sanções aplicadas pelo governo americano a autoridades brasileiras, como o próprio Moraes, por violações de direitos humanos e ataques à liberdade de expressão, a comoção pública serve como cortina de fumaça para avançar uma agenda de controle digital.
Logo após a repercussão do vídeo, entre 11 e 12 de agosto, a Câmara dos Deputados foi inundada com 32 projetos de lei (PLs) relacionados à “proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital” — entre eles a chamada “Lei Felca” (PL 3852/25), e o PL 2628/2022.
A pressão política foi tamanha que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), classificou o tema como “urgente” e pautou para esta terça-feira, 19 de agosto, a votação do requerimento de urgência do PL 2628/2022. A expectativa é de que o mérito do projeto seja apreciado já amanhã, 20 de agosto, em ritmo acelerado e fora do comum, evidenciando a intenção de aprovar a pauta sem debate aprofundado. Segundo a Gazeta do Povo, Motta priorizou o tema como estratégia para adiar a votação do PL da Anistia do 8 de Janeiro, bem como outras matérias sensíveis, como o fim do foro privilegiado.
Ao analisarmos o PL 2628/2022, ficam evidentes potenciais ameaças à liberdade de expressão e à privacidade. Na prática, a proposta pode se transformar em um instrumento de censura preventiva, com efeitos semelhantes aos criticados no polêmico PL das Fake News (PL 2630/2020). Entre os principais riscos:
Remoção sem ordem judicial: obriga plataformas a apagar conteúdos apenas com notificação, abrindo margem para censura arbitrária;
Monitoramento obrigatório: impõe filtros contra conteúdos “nocivos” ou “danosos”, termos vagos que podem barrar debates legítimos;
Verificação de identidade: pode exigir envio de documentos pessoais para acesso a redes sociais, ameaçando anonimato e aumentando a vigilância;
Controle parental compulsório: dá ao Executivo poder de validar mecanismos de bloqueio e rastreamento, criando risco de ingerência política;
Relatórios semestrais ao governo: transforma plataformas em fornecedoras de dados contínuos ao Estado, ampliando a vigilância;
Multas bilionárias: sanções de até 10% do faturamento ou R$ 50 milhões incentivam remoções excessivas por medo de punição.
A estratégia de utilizar a comoção pública para aprovar leis restritivas amplamente rejeitadas pela população, como o PL das Fake News, não é novidade. O mesmo roteiro já havia sido testado com a histeria em torno do jogo da “Baleia Azul” e, mais recentemente, com os ataques de atiradores em escolas — sempre apresentando a censura como “a única saída possível”.
A esquerda, carente de popularidade e apoio popular, apoia-se no “Complexo Industrial da Censura” — uma rede de interesses entre governo, big techs e ONGs progressistas — para calar opositores e avançar sua agenda, demonstrando que a proteção das crianças é secundária frente ao objetivo de controlar narrativas na internet. O caso Felca tornou-se, assim, mais um pretexto para a construção de um novo pânico moral. Curiosamente, eles confessam a estratégia: em artigo para a Folha de S. Paulo, os apresentadores globais Luciano Huck e Angélica afirmam que “é necessário direcionar comoção causada pelo vídeo de Felca” para a aprovação dos projetos de regulação das redes sociais.
A crítica à sexualização precoce de crianças é uma pauta antiga e central para a direita, que defende a preservação da infância e a responsabilização de abusadores. Agora, impulsionada pela denúncia — legítima e grave — do influenciador Felca, a esquerda tenta se apropriar do debate, mas em clara contradição com seu histórico.
Durante anos, setores progressistas relativizaram a sexualização de menores em eventos culturais, minimizaram casos de pedofilia e sustentaram um discurso de complacência com criminosos. Hoje, diante da pressão da opinião pública, esses mesmos grupos se reposicionam, não por uma real mudança de valores, mas como estratégia para avançar em outro objetivo: aprovar projetos de controle e censura nas redes sociais, usando o pânico moral em torno do tema como justificativa política.
O medo como ferramenta
Ao longo da história, momentos de abertura — seja pela emergência de novas ideias ou pela introdução de uma inovação tecnológica — frequentemente provocaram uma resposta de repressão. O advogado dinamarquês Jacob Mchangama, em Free Speech: A History from Socrates to Social Media (528 p., Basic Books, 2022), chama este fenômeno de "entropia da liberdade de expressão", um padrão histórico em que avanços no discurso livre geram reações que buscam contê-lo. Mesmo os sistemas mais liberais tendem a restringir o discurso assim que ele começa a ameaçar o status quo. Esse ciclo é geralmente impulsionado pelo "pânico das elites", um conceito descrito por Jacob Mchangama, que destaca o medo recorrente das classes dominantes de perder o controle sobre narrativas ou posições de poder. Durante esses momentos, novas ideias e tecnologias de comunicação, que ampliam o espaço público e permitem que vozes antes marginalizadas sejam ouvidas, passam a ser vistas como uma ameaça direta à ordem estabelecida.
Desde a imprensa de Gutenberg, inventada em 1440, passando pelo pânico gerado pelo telégrafo, o rádio e a televisão, até chegar às redes sociais e agora à inteligência artificial, cada avanço na democratização do discurso foi acompanhado por tentativas de controlar ou censurar conteúdos considerados "perigosos" ou "subversivos". As elites inicialmente enxergaram a internet e as redes sociais como uma ferramenta poderosa para controle em massa e engenharia social, como demonstram os casos da Primavera Árabe e do Euromaidan, na Ucrânia. No entanto, ao perceberem que as redes também geravam resultados imprevisíveis e nem sempre favoráveis aos seus interesses, concluíram que era essencial controlar o discurso na internet.
Foi nesse contexto que surgiu o Consenso da Censura — a ideia de que, em nome do combate à desinformação, ao discurso de ódio e a supostas ameaças à democracia, restrições à liberdade de expressão são não apenas aceitáveis, mas necessárias. A lógica desse consenso se baseia na premissa de que censura não é mais censura quando é feita "pelos motivos certos", e que certos discursos representam um risco tão grande que não podem ser tolerados.
Essa mentalidade levou à normalização da repressão a ideias divergentes, sempre sob o pretexto de combater a "desinformação" — mesmo que isso custe direitos fundamentais. O objetivo desse sistema vai muito além de controlar o que as pessoas dizem nas redes sociais. A verdadeira meta é frear o avanço de movimentos populistas de direita pelo mundo, consolidando o poder nas mãos de uma elite que se diz guardiã da "ordem democrática".
Parte desse objetivo também inclui evitar novos protestos como os de 2013, no Brasil, que começaram como pequenas manifestações contra o aumento das tarifas de transporte público, mas rapidamente se transformaram em uma onda de indignação popular. Reunindo milhões de pessoas, os protestos denunciaram a corrupção e os abusos do Estado, culminando em uma série de eventos que contribuíram para o impeachment da presidente petista Dilma Rousseff. O caráter orgânico e descentralizado dessas mobilizações expôs um potencial desestabilizador que assustou as elites, deixando claro que algo tão imprevisível precisava ser contido.
Hoje, a estratégia de censura e controle parece focada em impedir que algo semelhante volte a ocorrer. E, de certa forma, tem dado resultado: muitas pessoas evitam se manifestar por medo de serem acusadas de "atos antidemocráticos" ou perseguidas sob alegações de ameaçar o "Estado democrático de direito". O medo agora não é apenas um efeito colateral, mas uma ferramenta intencionalmente utilizada para silenciar vozes críticas e fragmentar qualquer tentativa de oposição organizada.
O medo é uma das estratégias mais eficazes para sustentar a censura. Seja o temor do desconhecido ou de ameaças concretas, ele serve como combustível para a manipulação coletiva. Ele cria um estado de vulnerabilidade no qual as pessoas, em busca de segurança e estabilidade, aceitam a supressão de liberdades como um preço razoável para se sentirem protegidas. Explorando o medo, o poder constrói narrativas que tornam a censura aceitável ou até desejada aos olhos da população. Esse mecanismo se apoia na ideia de que a censura é um "mal necessário" para evitar desastres maiores, como crises políticas, colapsos sociais ou ameaças à segurança pública.
Entre os estudiosos que analisaram como o medo é instrumentalizado para justificar ações repressivas, destaca-se o sociólogo britânico Stanley Cohen, criador do conceito de “pânico moral”. Cohen desenvolveu o conceito para descrever como uma ameaça percebida aos valores de uma sociedade é amplificada até gerar alarme social. Essa amplificação, frequentemente conduzida pela mídia e autoridades, mobiliza o público e cria um consenso que legitima ações repressivas, como a censura. Em sua obra Folk Devils and Moral Panics (1972), Cohen define o pânico moral como um estado de alarme social exagerado que transforma preocupações individuais em ansiedades coletivas. Sob o disfarce de proteção, essas ações restringem a liberdade, enquanto a população, imersa no medo, aceita como inevitáveis as medidas de “proteção” contra os chamados inimigos da moralidade ou ameaças sociais. Esses inimigos, que Cohen chamou de folk devils, podem ser grupos específicos, práticas culturais ou até tecnologias que desafiem normas estabelecidas.
‘Baleia Azul’, a primeira grande iniciativa censora
Em abril de 2017, uma onda de pânico tomou conta do Brasil quando boatos nas redes sociais começaram a circular sobre um jogo chamado "Baleia Azul", que estaria ligado a casos de automutilação e suicídio entre adolescentes em todo o país. Supostamente, dezenas de jovens em diferentes regiões teriam se envolvido em episódios de mutilação, e em alguns casos, até mortes. O jogo, composto por 50 tarefas, começava com desafios aparentemente inofensivos, como acordar de madrugada ou assistir a filmes de terror, mas progressivamente escalava para tarefas mais perigosas, culminando em automutilação e, finalmente, suicídio. Acreditava-se que "curadores" controlavam os grupos e pressionavam os jovens a completar todos os desafios, levando pais ao desespero, sem saber como proteger seus filhos desse suposto perigo crescente. O pânico se espalhou definitivamente após a publicação de reportagens sensacionalistas sobre o assunto. Veículos de mídia em todo o Brasil, incluindo a Record TV, apresentaram matérias que não só expunham o suposto funcionamento do jogo, mas também detalhavam como os jovens poderiam ser influenciados a participar.
A reportagem do Domingo Espetacular da Rede Record foi um ponto crucial para o aumento do medo. Após a veiculação da matéria, as buscas no Google pelo termo "Baleia Azul" e palavras relacionadas, como "suicídio", cresceram em 1.150%, de acordo com dados da SaferNet. Esse pânico refletiu o que especialistas chamam de "efeito Werther" — fenômeno em que a publicidade de um caso de suicídio estimula novos casos, especialmente entre adolescentes e jovens. Embora as investigações policiais afirmassem não haver evidências concretas de uma estrutura organizada por trás do jogo, o medo e o contágio psicológico gerados pelas reportagens foram suficientes para que grupos de jovens vulneráveis começassem a replicar o comportamento descrito, tornando o boato uma realidade. Como resposta, o Congresso Nacional brasileiro propôs uma série de projetos de lei que buscavam criminalizar a criação e o compartilhamento de fake news. Em 2018, havia mais de 20 propostas legislativas para criminalizar fake news, com penas que iam desde multas até oito anos de prisão. Uma destas propostas, feitas pelo Deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), se inspirava no projeto de lei proposto pelo governo da chanceler Angela Merkel, na Alemanha. Aprovada em junho de 2017 e vigorando em janeiro de 2018, a lei NetzDG, conhecida como “Lei do Facebook”, prevê que conteúdos “obviamente ilegais”, como discursos de ódio, devem ser removidos em até 24 horas sob penas de multas que podem chegar a 50 milhões de euros, dependendo da gravidade da infração. No Brasil estes projetos de lei foram recebidos com diversas críticas da imprensa e da academia. O temor era de que a criação de um tipo penal específico para fake news poderia abrir brechas perigosas para abusos e censura.
Especialistas apontavam que, em vez de resolver o problema, tais leis poderiam fomentar a autocensura e prejudicar o livre fluxo de informações. Além disso, muitos dos projetos de lei apresentavam definições vagas e subjetivas do que constitui uma "notícia falsa", o que poderia resultar na aplicação desigual da lei. Ainda que o pânico da “Baleia Azul” tivesse facilitado a aprovação de leis de censura, o presidente Michel Temer vetou artigo de um projeto de lei (PLC 110/2017) que obrigava a remoção de conteúdo considerado falso ou ofensivo nas redes sociais sem a necessidade de decisão judicial. A medida, aprovada pelo Senado, visava coibir a disseminação de fake news durante as eleições, mas foi amplamente criticada como uma forma de censura.
Em meados de 2016, com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos — seguida, dois anos depois, pela ascensão de Jair Bolsonaro no Brasil — ficou claro para as elites políticas e midiáticas o poder transformador das redes sociais. Ambos surgiram como outsiders e usaram as plataformas digitais como canal direto com a população, dispensando a mediação da grande imprensa e rompendo com o establishment político. A comunicação espontânea, massiva e descentralizada mostrou-se capaz de pautar debates, mobilizar multidões e até decidir eleições, quebrando o monopólio narrativo tradicional. Diante disso, antigos defensores da liberdade de expressão passaram a tratar a internet como ameaça e passaram a exigir mecanismos de controle. Afinal, era preciso calar as redes.
Assim, o discurso mudou: o que antes era visto como um princípio inegociável passou a ser tratado como obstáculo diante da suposta “emergência informacional”. Veículos de imprensa, entidades acadêmicas, agências internacionais e até ex-defensores da internet livre passaram a pedir regulação urgente, controle sobre plataformas, penalidades para quem disseminasse conteúdo considerado falso e responsabilização de redes sociais por postagens de seus usuários. A guerra contra a desinformação se tornou o novo consenso — e, com ela, a censura ganhou roupagens técnicas, jurídicas e morais para se apresentar como necessária.
Esse ambiente pavimentou o caminho para a formulação do Projeto de Lei 2.630/2020, o PL das Fake News, de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). O projeto buscava impor regras de rastreamento de mensagens, identificação de usuários e responsabilização das plataformas digitais por conteúdos considerados falsos. A proposta foi aprovada no Senado em 2020, mas enfrentou forte resistência na Câmara dos Deputados. A relatoria ficou a cargo de Orlando Silva (PCdoB-SP), e houve tentativas de acelerar a votação por meio de requerimentos de urgência. Ainda assim, o texto foi criticado por sua vagueza, falta de participação social no debate e riscos à liberdade de expressão. Especialistas apontaram que o projeto poderia gerar censura prévia, violar a privacidade dos usuários com exigências de rastreamento e incentivar a remoção excessiva de conteúdos pelas plataformas, temendo punições.
Mesmo sem aprovação legislativa, parte do conteúdo do PL foi implementado por via judicial. Em 2023, o ministro Alexandre de Moraes determinou a remoção de anúncios contrários ao projeto, alegando abuso de poder econômico. No ano seguinte, o TSE passou a exigir que redes sociais apagassem conteúdos considerados falsos mesmo sem decisão judicial — antecipando dispositivos do projeto e contornando o trâmite legislativo. As ações de Moraes, tomadas à revelia da Câmara, foram criticadas por extrapolar os limites constitucionais do Judiciário e aprofundar a insegurança jurídica em torno da liberdade de expressão no Brasil.
Em abril de 2024, diante da crescente rejeição e do impasse político, o então presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou o engavetamento definitivo do projeto. Tratou-se de uma manobra estratégica, já que Lira sabia que o texto não teria votos suficientes para aprovação, inviabilizando qualquer nova articulação política sobre o tema.
Apesar do fracasso legislativo, o debate sobre a regulamentação da internet seguiu vivo nos discursos de ministros do STF e de defensores da censura, que frequentemente argumentam que a internet seria uma "terra sem lei". No entanto, desde 2014, o Brasil já conta com uma legislação robusta nesse sentido: o Marco Civil da Internet, aprovado após amplo debate com a sociedade civil e com apoio suprapartidário no Congresso. O Marco Civil estabelece garantias fundamentais como a liberdade de expressão, a proteção da privacidade e a neutralidade da rede, além de definir a responsabilidade dos provedores de conteúdo. Pela norma em vigor, plataformas só podem ser responsabilizadas judicialmente após o descumprimento de ordem específica para retirada de conteúdo — exatamente o oposto do que vem sendo praticado sob ordens diretas do STF e do TSE.
Em 2021, o governo Bolsonaro chegou a apresentar uma medida provisória que alterava trechos do Marco Civil da Internet para impedir que plataformas removessem conteúdos de forma unilateral, sem decisão judicial. A proposta foi uma tentativa de garantir a liberdade de expressão diante do avanço da moderação privada e de decisões judiciais cada vez mais amplas. No entanto, a medida foi devolvida pelo Congresso e não chegou a ter validade. Em paralelo, Bolsonaro também vetou dispositivos da nova Lei de Segurança Nacional que criminalizavam a chamada “comunicação enganosa em massa”. Essas ações representaram uma das poucas tentativas institucionais de frear o avanço do controle sobre o ambiente digital.
O futuro aponta para novas tentativas de regulação, muitas com viés censor. Em junho deste ano, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet e, por 8 votos a 3, declarou sua inconstitucionalidade parcial, abrindo espaço para a responsabilização das plataformas sem necessidade de ordem judicial em situações graves, como incitação à violência, terrorismo e abuso infantil.
Ataques em escolas como justificativa para ampliar a censura e calar a oposição
Em novembro de 2022, um adolescente de 16 anos invadiu duas escolas em Aracruz (ES), matou quatro pessoas e deixou mais de dez feridos. O episódio marcou o início de uma sequência de ataques que, em vez de ser tratado como um problema de segurança pública, passou a ser explorado politicamente como prova de que a direita seria responsável pela radicalização juvenil. Em meio à comoção, não se falou apenas em medidas de proteção ou prevenção: surgiram propostas que chegavam ao ponto de sugerir a criminalização de todo um campo político.
No governo Lula, a resposta veio por meio de relatórios e discursos que deslocaram o foco da violência para a política. Pouco depois do massacre, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, dirigida por Daniel Cara, apresentou ao grupo de transição um estudo que relacionava os ataques ao bolsonarismo, à política de armas e até às escolas cívico-militares. Revelamos em A Investigação que o texto classificava como parte de um ecossistema “extremista” pessoas religiosas, conservadores contrários à agenda de gênero e críticos da doutrinação ideológica nas salas de aula.
Apesar de se propor como um documento técnico e neutro, Daniel Cara e outros integrantes da Campanha Nacional pelo Direito à Educação possuem forte alinhamento político. Daniel, filiado ao PSOL e candidato derrotado ao Senado em 2018, também fez parte do grupo temático de Educação na transição do governo Lula em 2022. A própria Campanha integra um comitê diretivo composto por organizações como Ação Educativa, ActionAid Brasil, CNTE, MST e Fineduca, além de redes internacionais como a Campanha Global pela Educação (CGE), a Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação (CLADE) e a Rede Lusófona pelo Direito à Educação (ReLus). Muitas dessas entidades recebem financiamento de fundações estrangeiras, como a Ford Foundation, a Fundação Kellogg, o Malala Fund, entre outras. Esse histórico reforçou a percepção de que o relatório não foi elaborado com foco em compreender a dinâmica dos ataques, mas sim para transformá-los em narrativa política, vinculando opositores a uma suposta onda de extremismo e responsabilizando setores conservadores pelas tragédias.
As declarações de autoridades seguiram a mesma linha. Alexandre de Moraes e Flávio Dino afirmaram que os ataques em escolas guardavam semelhança com os atos de 8 de janeiro, como se ambos fossem manifestações de uma mesma ameaça “neofascista”. Gilmar Mendes culpou a flexibilização do porte de armas no governo Bolsonaro. Em todos os casos, o que deveria ser um debate sobre falhas de segurança e prevenção foi substituído por uma narrativa de responsabilização política.
O passo mais explícito foi dado pelo deputado André Janones, que chegou a propor a criminalização do “bolsonarismo”, comparando-o ao nazismo. A iniciativa não prosperou, mas deixou claro o rumo pretendido: transformar opositores em inimigos públicos e legitimar, sob o pretexto da proteção das crianças, medidas de censura e perseguição política.
O caso de Aracruz foi seguido de outros atentados em 2023, o que reforçou ainda mais a narrativa governista. Em fevereiro, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio de Almeida, criou um grupo de trabalho para estudar “discurso de ódio e extremismo” e propor soluções. A coordenação ficou a cargo de Manuela d’Ávila (PCdoB), ex-deputada federal e candidata a vice na chapa de Fernando Haddad em 2018, e o grupo contou também com nomes como o influenciador Felipe Neto e acadêmicos conhecidos por militarem contra o bolsonarismo. O relatório produzido pelo GT retomou as mesmas teses apresentadas por Daniel Cara: os ataques seriam expressão de um “terrorismo de extrema-direita”, ligado ao bolsonarismo e à chamada “cultura armamentista”. Entre as recomendações, estava a criação de um órgão regulador para monitorar redes sociais, a responsabilização legal dos chamados “superspreaders do ódio” e a implementação de um “pacto nacional” de enfrentamento ao extremismo.
Ao assumir como premissa que a violência escolar teria origem no “ecossistema digital da direita”, o documento praticamente ignorou fatores como falhas de segurança, ausência de protocolos escolares e negligência estatal. Ainda assim, serviu como combustível para reaquecer o debate regulatório no Congresso. O discurso institucional do MDHC acabou alimentando a retomada das propostas legislativas de regulação da internet, como o PL 4691/2024, e fortaleceu o ambiente para a guinada do STF sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet. Ao vincular ataques em escolas à atividade política da direita, o governo e seus aliados criaram uma narrativa que justifica a censura como ferramenta de segurança pública. Tragédias reais, em vez de conduzirem a políticas de prevenção eficazes, foram instrumentalizadas para abrir caminho a medidas que ampliam o controle estatal sobre a fala de opositores.
Entre os participantes do GT também estavam figuras como Guilherme Casarões, professor da FGV e coordenador do “Observatório da Extrema Direita”, e a antropóloga Rosana Pinheiro-Machado, colunista e pesquisadora ligada ao Intercept, ambos conhecidos por associar o bolsonarismo a fenômenos autoritários ou mesmo ao nazismo. A presença de nomes com histórico de ativismo político reforçou a crítica de que o grupo não buscava um diagnóstico técnico, mas sim construir legitimidade acadêmica e moral para enquadrar a oposição como ameaça à democracia. O resultado foi um relatório mais próximo de um manifesto ideológico do que de uma política pública voltada à proteção de crianças.
Denúncias abafadas
Nunca foi pelas crianças. Isso fica claro quando se observa que as denúncias contra Hytalo Santos, que agora ganharam repercussão nacional após o vídeo do Felca, já haviam sido feitas por outras pessoas antes — entre elas, a atriz Antônia Fontenelle. Em 2024, ela publicou vídeos acusando Hytalo de sexualizar menores. Mas, em vez de ser ouvida, acabou processada e obrigada pela Justiça a remover o conteúdo, sob pena de multa diária.
O mesmo ocorreu com a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que em 2022 denunciou casos de estupro coletivo, tráfico e mutilações de crianças na Ilha de Marajó. Suas declarações foram classificadas como falsas pelo Ministério Público Federal, que a processou pedindo R$ 5 milhões em indenização por danos morais e sociais, além de responsabilizar a União. A pauta da proteção de crianças é especialmente significativa para Damares, que já relatou ter sido vítima de abusos na infância. Em sua biografia, ela narra que, diante do sofrimento, chegou a planejar o suicídio, mas desistiu após um encontro com Deus “em cima de uma goiabeira” — episódio que se tornou alvo de zombarias constantes por parte de ativistas de esquerda. Assim como no caso de Antônia Fontenelle, o que esteve em jogo não foi a gravidade das denúncias, mas quem as fez.
Em 2 de julho de 2024, publicamos uma reportagem em A Investigação revelando que as salas de bate-papo do UOL, um dos maiores portais de internet do Brasil, servem como esconderijo virtual para criminosos que vendem vídeos e imagens de abuso sexual infantil, incluindo estupros de bebês e crianças. A investigação identificou vendedores usando códigos para burlar a moderação, oferecendo milhares de arquivos via Telegram e pagamentos em fintechs. Além disso, salas com temática sexual são acessadas por menores de idade que marcam encontros com adultos e até se oferecem por Pix, expondo falhas graves na plataforma.
Nossa equipe procurou a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos para encaminhar os detalhes da investigação, mas fomos informados de que só poderiam agir mediante dados como nome e endereço das vítimas e suspeitos. Ao esclarecer que se tratava de ocorrências virtuais, a resposta foi de que não havia possibilidade de registrar a denúncia no órgão. Na sequência, também fizemos uma denúncia no Ministério Público Federal com os detalhes coletados, mas até hoje, mais de um ano depois, não iniciaram investigação.
O mesmo se repetiu em maio de 2024, quando uma investigação do MPF em Rondônia foi arquivada por “falta de evidências” — apesar de jornlistas terem encontrado o material em menos de uma hora. O UOL, embora mantenha termos de uso que proíbem esse tipo de conteúdo e um acordo com o MP-SP desde 2005, não respondeu às perguntas da nossa reportagem e se limitou a alegar que oferece mecanismos de denúncia.
A hipocrisia da esquerda
A esquerda que agora se utiliza do pânico moral para avançar projetos de censura em nome da proteção das crianças é a mesma que, ao longo da história, relativizou a pedofilia e a sexualização precoce de crianças e adolescentes. Muita gente não sabe, mas na década de 70 diversos intelectuais franceses assinaram manifestos pedindo a descriminalização de relações sexuais entre adultos e crianças menores de 13 anos. Entre eles estavam Jean-Paul Sartre, Michel Foucault e Simone de Beauvoir — esta última, considerada até hoje a matriarca do feminismo moderno. Não se tratava apenas de um devaneio de época. Esses pensadores lançaram as bases do pós-modernismo, corrente que mais tarde alimentaria a militância identitária e o movimento Woke.
E não foi apenas um apoio ideológico. Beauvoir e Sartre cultivaram em sua vida pessoal relações intensas e problemáticas com adolescentes. Utilizand-se de sua posição como professora, Simone atraía suas alunas e as entregava nas garras de Sartre. Uma de suas alunas, Bianca Lamblin, relatou os traumas de ter sido envolvida num triângulo amoroso com o casal aos 16 anos. Por um caso com outra aluna, Simone ficou temporariamente proibida de dar aulas na França em 1943. Foucault, por sua vez, foi acusado por colegas de abusar de crianças de oito a dez anos durante sua estada na Tunísia, no fim dos anos 1960. Apesar disso, as obras de ambos são celebradas até hoje como referência acadêmica.
No Brasil atual não faltam casos de hipocrisia. Quem não lembra do caso de Suzy, transexual que recebeu um abraço do médico Drauzio Varella na prisão devido à “solidão”. O problema? Suzy, cujo nome de batismo era Rafael Tadeu de Oliveira Santos, estuprou e matou um menino de 9 anos. A reportagem, apresentada como um retrato humano da solidão nas prisões, omitiu deliberadamente o crime da pessoa entrevistada. Em resposta às críticas, Varella disse que era médico, não juiz.
E o caso do “Peladão do MAM”? Em 2017, o Museu de Arte Moderna de São Paulo apresentou a performance “La Bête”. Durante a apresentação, o artista Wagner Schwartz ficava nu no centro do espaço e convidava o público a interagir com seu corpo. Crianças presentes foram incentivadas a participar da dinâmica, inclusive tocando no performer, o que gerou forte reação pública. O Ministério Público abriu investigação, mas o museu defendeu-se alegando tratar-se de arte contemporânea.
E o que dizer das multas milionárias impostas a Olavo de Carvalho e Flávio Morgenstern por terem associado o cantor Caetano Veloso à pedofilia, já que era público e notório que Caetano tirou a virgindade de sua futura esposa Paula Lavigne no aniversário de 40 anos dele? Detalhe: ela tinha apenas 13 anos. Para a Justiça, no entanto, a relação não configurava pedofilia, tratando as acusações como ofensas difamatórias e caluniosas que abusavam da liberdade de expressão, com o intuito de depreciar a imagem do artista.
Não podemos, claro, esquecer do padre Júlio Lancellotti que — além de ter pago mais de R$ 700 mil em dinheiro, carros (como uma Mitsubishi Pajero e dois importados, incluindo um Audi), aluguéis e imóveis para que um ex-interno da Fundação CASA, que ele supostamente abusou, não revelasse sobre supostas relações entre eles enquanto ele era um adolescente — foi flagrado em um vídeo se masturbando para alguém que ele acreditava ser um adolescente. Mesmo que perícias tenham sido feitas confirmando a veracidade do vídeo, toda a militância de esquerda e o próprio ministro Alexandre de Moraes saíram em defesa de Lancellotti.
A erotização e sexualização precoce de crianças e adolescentes tornou-se um fenômeno visível na indústria do entretenimento brasileiro. Em especial entre as estrelas pop que, por razões desconhecidas, declararam apoio a Lula durante as eleições de 2022. Um dos exemplos mais polêmicos ocorreu em julho de 2022, quando Luísa Sonza lançou o clipe “Cachorrinhas”, no qual aparece a influenciadora Belle Belinha. À época, Belinha tinha cerca de 16 ou 17 anos. Belinha, que ganhou notoriedade justamente por seu comportamento promíscuo e de forte apelo sexual, já foi flagrada vendendo “packs” de fotos íntimas ainda durante a adolescência. Ela chegou a ser investigada por conteúdos considerados inadequados, como quando apareceu em vídeo oferecendo bebida alcoólica a uma criança. Em janeiro de 2024, Belinha fez 18 anos e a primeira coisa que fez foi criar perfis em plataformas pornográficas como OnlyFans e Privacy.
Embora se faça de desentendida, a esquerda aprova e apoia esta cultura. Em julho de 2024, o presidente Lula sancionou sem vetos a Lei nº 14.940/2024, que institui o Dia Nacional do Funk, celebrado anualmente em 12 de julho. O PL original foi apresentado pelo então deputado Alexandre Padilha (PT-SP) e relatado no Senado pela senadora Janaína Farias (PT-CE). A justificativa era reconhecer o funk como uma importante expressão cultural periférica e fomentar políticas públicas voltadas às comunidades envolvidas.
A aprovação da lei foi festejada por páginas de entretenimento como o perfil Choquei, nas redes sociais. O mesmo perfil que impulsionou figuras como Belle Belinha e Hytalo Santos — ambos envolvidos em polêmicas relacionadas à exploração sexual e exposição de menores — agora se esquiva diante das denúncias de Felca. Vale lembrar: o Choquei esteve entre os influenciadores digitais que fizeram campanha explícita por Lula em 2022.
Em outubro de 2023, o Ministério da Saúde realizou em Brasília o “1º Encontro de Mobilização de Adolescentes e Jovens para a Prevenção às IST/Aids”. Durante a programação, uma apresentação de dança com teor sexual explícito chamou a atenção. Ao som de uma versão da música “Batcu”, originalmente interpretada pela drag queen Aretuza Lovi em parceria com Valesca Popozuda, uma dançarina chegou a rebolar e expor as nádegas diante do público. O vídeo viralizou e gerou indignação por expor jovens a um conteúdo sexualizado em um evento oficial. Só depois da enxurrada de críticas o Ministério da Saúde admitiu que a performance foi “inapropriada” e exonerou Andrey Lemos, então diretor da área de HIV/Aids. Para piorar, o encontro custou quase R$ 1 milhão aos cofres públicos.
A esquerda quase não trata da proteção da infância como prioridade — a não ser quando pode usar o tema como arma política. Durante as eleições de 2022, militantes e perfis alinhados ao PT e PSOL espalharam em massa a acusação de que Jair Bolsonaro seria pedófilo, após ele dizer que “pintou um clima” ao ver meninas venezuelanas de 14 ou 15 anos. A tag “Bolsonaro pedófilo” foi impulsionada como estratégia de desgaste eleitoral. O episódio mostrou o oportunismo político: acusações infundadas ganharam repercussão, enquanto apenas aliados do ex-presidente sofreram retaliações políticas ou jurídicas.
Por outro lado, quando surgem propostas concretas para punir abusadores, como a castração química, partidos de esquerda — entre eles PT e PSOL — se posicionaram contra, chamando a medida de “desumana”. A contradição fica evidente quando se observa que o mesmo campo político defende o bloqueio hormonal em crianças e adolescentes trans, usando fármacos semelhantes ou idênticos aos da castração, como análogos de GnRH e medroxiprogesterona.
Não por acaso, a esquerda também tentou boicotar o filme Sound of Freedom, que denuncia o tráfico sexual infantil. Agora, o governo Lula posa de guardião da infância e tenta colar em quem critica a agenda de ”regulação das redes sociais” a pecha de ser “contra a proteção de crianças” ou até mesmo “conivente com abusadores”. É oportunismo político puro.
Nas próximas reportagens desta série, vamos apresentar estratégias práticas para identificar, expor e prender abusadores de crianças, além de revelar a existência de uma rede estruturada de venda desse tipo de conteúdo, com detalhes sobre seus métodos e conexões internacionais. Também vamos demonstrar que é possível endurecer a lei para combater pedófilos e exploradores sem que isso se transforme em um instrumento de censura.
Cara agora fiquei encucado! O Felca manipulou facilmente muita gente com seu discurso poise a causa é justa e envolve crianças. Percebi também que a toda a palta sobre essa censura gira em torno de crianças, motivo pelo qual muita gente acha sensível e capaz de aprovar. Sabendo que por trás de cada criança tem alguém que inicia o ato, tipo da baleia azul ou ataques contra escolas.
Seriam elas também manipuladas, pois tem a mente em desenvolvimento ainda.
Resumindo, no meu ponto de vista esse caos é implantado para que crianças comentam os atos, no fim eles tentam censurar para conter algo que possivelmente eles mesmo criaram
Muito bom!! Retrospectiva verdadeira e factual.